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terça-feira, 11 de maio de 2010

Ela e Ele?

Cabelos longos, sedosos e penteados. Blusa azul ou branca, bermuda jeans clara, casaco amarrado na cintura. Ah, quase me esqueço, óculos de metal sobre os olhos de chocolate. Material. Cadernos - cheios de poesias românticas de Vinícius -. Bolsa de fivela atravessada e discreta. iPod - Sentimental, Los Hermanos - . E All Star azul . Adiantada, como sempre.
Cabelos ralos, molhados e desarrumados. Blusa qualquer-uma, calça qualquer-outra, casaco posto sobre os ombros. Ah, quase me esqueço também, óculos de acetato sobre os olhos verde-oceano. Material. Papelada - cheia de notas da poesia ébria de Vinícius-. Mochila esportiva e chamativa, indiscreta. iPod - Casa Pré-Fabricada, Los Hermanos-. E sapatênis bege ou marrom. Atrasado, como sempre.
O cotidiano era sempre assim. Começava cedo, muito cedo. Assistir às aulas e ministrar as aulas. Sempre acabavam se desligando por, pelo menos, um pouco da realidade. Fugia nele e fugia nela. Mas era segredo e segredo.
Ela era querida, sempre sorrindo à vida. Espontânea. Vivia de amor, amava viver. Amava demais. Ele era necessário, sempre criticando a vida, ranzinza. Vivia de palavras, amava as palavras. Mas vivia cansado demais até para falar. Falar dele mesmo.
Por dois anos, viveram seis dias por semana por si mesmos e, nas quintas feiras, deixavam-se seguir dois a dois por mínimas duas horas e meia. Era normal que os dias se arrastassem até o dia de dizerem "Finalmente...",quando se encontrariam. Ela, ousada, interpretava-o em seu silêncio, onde ele buscava esconder-se. Ele sempre desistia, se deixava ser lido. E era tudo o que tinham tido, até aquela semana.
Essa semana, tinha sido cotidiana como todas as outras muitas guardadas na lembrança. Então, às aulas:
 Ele sempre olhava o caderno dela - suas poesias o preenchiam-. Ela sempre permanecia olhando os olhos dele - sua cor a refrescava -. As frases ditas eram mudas, mas cheias de som. Eram palavras que saíam altas no silêncio dos dois. Segredo, segredo. Silêncio, silêncio.  Permanecia e se mantinha sem ser quebrado, era errado, era bom demais para ser verdade. Mas era desejo, anseio.
 Foi quando ela decidiu falar mais. Cansara-se de conter-se em si mesma. Ela precisava. Ele aguardava. Sim, sacou do estojo uma caneta qualquer - não importava mais - e escreveu um bilhete, de três palavras. Entregou-lhe no final das 2hrs30, olhando-o nos olhos de oceano.
Ele pôde sentir a intensidade do olhar de chocolate maior que o univeso. Recebeu-a, enfim, depois de 2horas e 25minutos exatos. Olhou o papel dobrado-de-qualquer-jeito. O desdobrou aos poucos, sem pressa. Ele queria, e muito. Mas  não devia encontrá-los. Encontrar os dois pronomes, separados por uma conjunção aditiva e terminados em uma interrogação- a cor da caneta era vermelho escuro - :
" Você e Eu ? ", dizia o bilhete.
Foi quando ele decidiu que o bilhete precisava ser acrescentado em mais uma palavra e depois, devolvido. Cansara, também, de conter-se em todo o seu Português. Ele precisava. Ela agora, aguardava :
" Sim ..."


Por Camille Lyra

Dedicada à Ela da vida real.

Um comentário:

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Camille Lyra. O nome fala muito da feição, tanto na sua significância quanto na sua origem; já o sobrenome faz jus à escrita predileta da autora. Sempre curiosa demais, sonhadora demais, ambiciosa demais, romântica demais, intensa demais. E, daquilo que exceder tudo isso, faço poesia.